Passado vulgar

De repente sinto-me mais vulgar que um caroço de maçã. Ou até uma maçã só por si. E tudo isto porque insisto em viver para o passado.

Não sei.

É uma doença infernal, como se de mim se tratasse. Há risos loucos, ou sãos, que me envolvem nesta melancolia que não é minha. Há vinho. Há bebida grátis. Há amor que não existe. Há amor a mais.
Tenho vontade de chorar, mas quem chora não sou eu. Tenho vontade de fugir, mas que foge de mim não sou eu. Tenho-me como nunca tive ninguém. Não me dou. Não me dou.
Palavras saem, entram, fecham-se a cada segundo, e o meu peito não se alivia. Contrai-se a cada fracção de tempo que se constrói.
Se faz sentido? Se me queres, mesmo assim? As minhas dúvidas são maiores, e as lágrimas não cessam em não cair.
A indiferença que te constrói dói-me a cada mão que se mexe. "Estou no meu mundo, estás no teu.", como se tudo fizesse sentido até ao fim, para que tudo faça sentido. Até ao fim.
Já nada o faz. Já tudo foi para muito mais longe que nós.

Na minha participação que conduz à realidade, a fugaz razão de tudo foge como se eu não devesse saber o porquê de amanhã, de depois, de quando, de porquê. E assim fico, melancólica, com vontade de saber mais do que a certa incerteza de nada ser exacto. Concluo metamorfoses de coisa nenhuma porque há sempre mais a acrescentar, e a curiosidade que matou o gato não me mata a mim.

Adoro quando sou feliz.

Pablo Neruda - me gustas quando callas

Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.

Como todas las cosas están llenas de mi alma
emerges de las cosas, llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía.

Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza:
déjame que me calle con el silencio tuyo.

Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.

Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.
Se me perguntarem de que é que tenho mais medo, o que é que mais me atormenta e me repele: o futuro. Incerto.
É uma imagem terrível de trémulas ideias, trémulas vontades, trémulas decisões. Nada está feito e tudo há por fazer, como se o futuro representa-se para sempre em mim a idade adulta. A idade em que tudo se torna sério mas ao mesmo tempo tudo está desfocado e cinzento e com poucas cores. Até lá chegar.
Como é que chego ao futuro?
Vontade não me falta de levantar o rabo e seguir viagem, mas o meu rabo ultimamente anda demasiado pesado.